terça-feira, 20 de outubro de 2009

Coleções por Daniel Tammet

Uma das maiores fontes de frustração para meus pais foram minhas coleções obsessivas de diferentes coisas, como as castanhas marrons brilhantes que caiam no outono em grandes quantidades das árvores enormes que pontilhavam a estrada comprida perto de nossa casa.

Meus pais não gostavam que eu saísse sozinho. Assim, eu coletava as castanhas com meu irmão Lee. Eu não me importava - ele era um par extra de mãos. Recolhia cada castanha do chão com meus dedos e empurrava sua forma regular redonda para a concavidade de minha palma (hábito que mantenho até hoje - a sensação tátil tem uma ação reconfortante, embora agora eu prefira moeda ou bolas de gude). Enchia os bolsos um por um com as castanhas até lotar todos eles. Era como uma compulsão, eu simplesmente tinha de coletar cada castanha que conseguia encontrar e reuní-las num só lugar.

Tirava sapatos e meias e os enchia de castanhas também, voltando descalço para casa com mãos, braços e bolsos transbordando castanhas.

De volta à casa, despejava as castanhas no chão do meu quarto e contava-as várias vezes. Meu pai trouxe um saco de lixo e sugeriu que, enquanto as contasse, jogasse as castanhas lá dentro. Eu passava horas todos os dias coletando as castanhas, levando-as até o meu quarto e rapidamente enchendo o saco num canto.

No final, meus pais temeram que o peso das castanhas recolhidas pudesse danificar o teto do aposento sob o meu e levaram o saco para o jardim. Eles toleraram minha obsessão, deixando que eu continuasse brincando com as castanhas no jardim, mas sem trazê-las para casa. Com o passar dos meses, meu interesse acabou sumindo, e as castanhas mofaram, até que meus pais enfim providenciaram a sua remoção para o depósito de lixo local.

Pouco tempo depois, surgiu um interesse obsessivo em colecionar folhetos, de diferentes tamanhos. Costumavam ser despejados na nossa caixa de correio junto com o jornal local ou a correspondência da manhã, e eu me fascinava com seu aspecto reluzente e forma simétrica (não importava o que estava sendo anunciado - o texto não me importava). Meus pais logo reclamaram das pilhas precariamente empilhadas que se acumulavam em cada gaveta e cada prateleira da casa, especialmente quando se esparamavam pelo chão sempre que alguém abria um armário.

Como no caso das castanhas, minha mania de folhetos gradualmente desapareceu, para alívio dos meus pais.

Naquele verão, pela primeira vez permitiram que eu percorresse sozinho a distância curta entre a casa e a escola. O caminho era orlado por uma fileira de sebes e, certa tarde, ao voltar do colégio, notei um inseto vermelho minúsculo coberto de pontos pretos rastejando dentro de uma delas. Fascinado, sentei-me na calçada para observá-lo de perto, subindo e descendo por cada folhinha e galho, parando e recomeçando e voltando a parar em diferentes pontos ao longo de seu trajeto.

Suas costas pequenas eram redondas e brilhantes, e contei seus pontos várias vezes. Os transeuntes na rua me contornavam, alguns deles resmungando a meia-voz. Eu devia estar no meio do caminho, mas naquele momento, não pensava em outra coisa além da joaninha à minha frente. Cuidadosamente, estendi meu dedo para que ela subisse nele e corri para casa.

Eu nunca tinha visto joaninhas, a não ser nas figuras dos livros, mas havia lido tudo sobre elas. Empolguei-me com minha descoberta e quis capturar o máximo de joaninhas possível. Lá em cima, no meu quarto, havia um recipiente de plástico onde eu mantinha minha coleção de moedas. Esvaziei-o, despejando as moedas no chão, formando uma montanha de metal, e pus a joaninha dentro do recipiente.

Depois, voltei à rua e passei várias horas, até não conseguir enxergar mais nada de tão escura que estava a noite, olhando dentro das várias sebes em busca de joaninhas. Ao encontrar uma, pegava-a delicadamente com as pontas dos dedos e colocava no recipiente, junto com as outras. Eu havia lido que as joaninhas gostam de folhas e de pulgões; portanto arranquei das sebes montes de folhas e algumas urtigas com pulgões, colocando tudo no recipiente com as joaninhas.

Ao voltar para casa, levei o recipiente de volta para o quarto, colocando-o sobre a mesa de cabeceira. Com uma agulha, abri alguns buracos nas laterais do recipiente para que as joaninhas dispusessem de ar e luz suficientes em sua nova casa, depois tapei o recipiente com um livro grande para impedir que elas saissem voando pela casa. Na semana seguinte, todo dia após o colégio eu saia e colhia mais folhas e pulgões para as joaninhas, trazendo-os para o recipiente no meu quarto. Salpiquei água em algumas das folhas para que as joaninhas não sentissem sede.

Na escola, eu falava sobre as joaninhas sem parar, até meu professor, o Sr Thraves, exasperado, pediu que eu trouxesse para a aula. No dia seguinte, trouxe o recipiente comigo para a escola e mostrei minha coleção de joaninhas para ele e as crianças da turma. Àquela altura, eu havia encontrado e colocado centenas de joaninhas naquele recipiente. Ele deu uma olhada e, em seguida, pediu que eu pusesse o recipiente na mesa dele. Deu-me uma folha de papel dobrada para que a levasse ao professor da turma ao lado.
Demorei alguns minutos para fazer isso e, quando voltei, o recipiente havia sumido. O Sr. Thraves, temendo que as joaninhas escapassem do recipiente e voassem pela sala de aula, pedira a uma das outras crianças que o levasse para fora e soltasse todas as joaninhas. Quando percebi o que havia acontecido, senti como se minha cabeça fosse explodir. Irrompi em lágrimas e saí correndo do colégio até em casa.

Absolutamente perturbado, não disse uma palavra ao professor durante várias semanas, e se ele chamasse meu nome eu me agitava.

Texto extraído do livro Nascido em um Dia Azul de Daniel Tammet

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